terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

VERBETE

"Prasempre!" Desde que escutei pela primeira vez,a sonoridade me pareceu pouco nítida para não dizer completamente fora do foco da realidade. Dia desses, uma mulher me perguntou se eu seria capaz de amá-la prasempre, e eu, assim como os demais de nós, homens supostamente intelectualizados e temerosos de nossos sentimentos, busquei aquela saída convencional dizendo que sempre é algo muito distante. Muito além do alcance humano. No entanto ela disse que me queria prasempre, foi quando me dei conta que também a queria com igual intenção e que não era nenhuma desonra confessar tal aspiração. Daí em diante a preocupação passou a ser outra: "como construir o prasempre?" Decididamente não seria com o mesmo material utilizado por muitos de meus conhecidos. Como fazer? Resolvi então que a partir da certeza do meu amor por essa mulher e das sensações incomparáveis que ela me causa, se tornava óbvio objetivar a continuidade do prazer. Exemplo eu tinha. Quando garoto meu professor de literatura escreveu duas frases-dedicatórias num exemplar de livro seu. Professor e frases estão em mim.Prasempre. No frigir dos ovos somos todos egoístas e tudo que buscamos é com a intenção de que seja prasempre. Que o automóvel não enferruje, que o vaso jamais quebre, que as fotografias nunca se apaguem e aqueles que amamos estejam sempre a nossa disposição. Poucos admitem, mas a verdade é essa. Logo cedo percebi a morte, o fim, isso num primeiro momento me abalou, me derrotou, por que continuar um jogo com o resultado previamente estabelecido onde todos perdem e o grande adversário invisível acumula regozijos cínicos? Minha infância foi a tentativa de evitar e depois compreender o veneno anti-ético da morte. Meu pai, minha mãe, meus irmãos, meus amigos, um dia todos desapareceriam assim como já acontecera com meu gato, com meu cachorro de estimação e meus passarinhos. Minha assustada meninice me postava entre dois extremos: um de onde mal eu tinha saído e outro que jamais seria alcançado. Porém como quase toda criança, no meu caso com um pouco mais de dor, conseguia deixar de lado os pensamentos comprometidos com a realidade e junto com meus amigos visitava o jardim das fantasias. Cresci e optei pelo mundo da minha imaginação. Sua existência dependia de mim, se eu tinha os planos era por que a construção era viável. Meu objetivo era trapacear, enganar a morte, desviá-la daqueles que eu queria bem, que na verdade guardavam pedaços meus e se morressem, eu morreria também. Se a fantasia não me impediu de sofrer pelo menos me fez entender que algumas coisas podem ser prasempre. E só pode ser pra sempre tudo aquilo que não exigir espaço. Mas o prasempre é algo que não surge livre da dor, infelizmente. Foi assim com meu professor, foi assim com outras poucas coisas e está sendo assim com meu amor. Falo de meu grande amor que foi precedido da minha dor e solidão frutos ácidos da autodepreciação e preguiça de acreditar na fantasia. A solidão é um artifício muito utilizado pelos covardes da minha laia. Nos escondemos, congelamos nossa afetividade e se não amamos não corremos o risco da rejeição, da perda, da frustração. E assim permitimos o tempo andar sobre nós. Até um dia... O dia em que percebemos que podemos permanecer assim prasempre. Sem dor, sem medo, imóveis. Como as pedras. A pedra escondida é a materialização do prasempre, pior, muito pior que estátua. Minha fantasia exige movimento e eu não sabia, talvez por isso me doesse tanto estar parado. Pouco importando se frente ao mar ou deserto.
Em certo entardecer meu mundo começou a rodar no sentido oposto. Fazia frio e alguém acendeu a luz, meus amigos e parentes continuavam morrendo, normal quando a infância é um carrinho distante virado de rodas pro ar no marco zero de minha caminhada. Normal, porém triste. E naquele dia eu vi a mulher que também me viu. Alguns dias se sucederam até revê-la e então trocamos algumas palavras, o suficiente para eu me dar conta que desde minha infância sonhava com uma mulher como aquela. Hoje o sonho é também meu despertar e quando sofro é simplesmente por que ela não está comigo. E como sofro!!!! Nunca amei assim, nunca sofri tanto assim. E se digo isso é para comprovar que esse é meu amor definitivo. Se é definitivo significa que é prasempre? A pergunta se justifica embora nem sempre o definitivo represente o prasempre . Ainda mais em se tratando de amor, pois o que é o amor? Amor é aquilo que não sobrevive individualmente. Sendo o amor o mais dissimulado dos sentimentos é também o terreno preferido do prasempre pois não é raro o amor se apresentar com a maquilagem da ilusão. Ex. Quando um afirma amar prasempre na intenção de obter alguma vantagem ou mera manutenção de algo que o satisfaz. A individualidade tentando dominar aquilo que ela acredita ser amor e, no entanto é um mero exercício de violência. Contra seus próprios sentimentos e contra o outro. O amor nunca é prasempre visto que é vivo e tudo que é vivo precisa morrer. Mas o que me interessa é o mundo da fantasia e da minha imaginação o que me leva a acreditar num amor imortal. É isso. Não eu não tenho 17 anos, tenho muito mais e não acredito em nada, nada mesmo que não seja produto da fantasia, do imaginado, do sonhado. Eu sempre sonhei com essa mulher, eu não sabia, mas era ela, não havia a definição de um rosto e podia ser qualquer rosto mas era ela , o sonho naqueles dias de meninice já era sonhado, não eu não tenho 17 anos, tenho muito mais e acredito no meu sonho, um sonho prasempre.Mas acreditar não basta é preciso viver a realidade com fantasia, fazer da vida, da minha vida, um sonho bom. Mas que não me obrigue a despertar na melhor parte. Viver é preencher o álbum dos acontecimentos. E só merece esse título aquilo que transforma. Um acontecimento pode ser o desabrochar de uma rosa, caso eu presenciasse, o passarinho rompendo a casca do ovo sob meu olhar. No entanto isso nunca aconteceu, quando eu chego eles já estão lá, a rosa e seu perfume, o pássaro e seu canto. Na minha vida foram raros os acontecimentos, nascimento e morte de filhos, duas ou três amizades, alguns livros e um entardecer de Abril.Agora me atrevo a dizer que descobri o significado do "prasempre". Prasempre é simplesmente a vontade de estar bem e eu quero confessar aqui diante de todos vocês que de uns tempos pra cá só me sinto bem junto dessa mulher. Dia desses recebi alguns elogios e contei ao meu pai, ontem uma atriz famosa pediu um texto meu e contei o fato para o Marcelo, para o Ronaldo, minha vida não vale nada se eu não transmitir às pessoas que amo um pouco de alegria, é uma dívida sendo amortizada, pois não consigo ver muita graça em mim, se não fossem meus amigos, meu pai, meus filhos...não sei.Cedo, muito cedo, me dei conta que eu era apenas um fragmento. Daí a acreditar que o fragmento era do nada, um pó do futuro não foi preciso muita reflexão, confesso. Pai, amigos, filhos me mantinham num permanente recreio, por um tempo eles foram suficientes, mas tudo tem um limite, o abismo me aguardava e eu, covarde, apenas olhava. Até que surgiu essa mulher e hoje, sem afobação, posso amar muito mais a todos que me amam e aqueles que não são amados por ninguém. Já não me sinto um grão do nada, mas um pedregulho do amor.Rejane, eu te amo prasempre.

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